segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Adormecida


Uma noite, eu me lembro... Ela dormia 
Numa rede encostada molemente... 
Quase aberto o roupão... solto o cabelo 
E o pé descalço do tapete rente.
'Stava aberta a janela. Um cheiro agreste 
Exalavam as silvas da campina... 
E ao longe, num pedaço do horizonte, 
Via-se a noite plácida e divina.
De um jasmineiro os galhos encurvados, 
Indiscretos entravam pela sala, 
E de leve oscilando ao tom das auras, 
Iam na face trêmulos — beijá-la.
Era um quadro celeste!... A cada afago 
Mesmo em sonhos a moça estremecia... 
Quando ela serenava... a flor beijava-a... 
Quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia...
Dir-se-ia que naquele doce instante 
Brincavam duas cândidas crianças... 
A brisa, que agitava as folhas verdes, 
Fazia-lhe ondear as negras tranças!
E o ramo ora chegava ora afastava-se... 
Mas quando a via despeitada a meio, 
P'ra não zangá-la... sacudia alegre 
Uma chuva de pétalas no seio...
Eu, fitando esta cena, repetia 
Naquela noite lânguida e sentida: 
"Ó flor! — tu és a virgem das campinas! 
"Virgem! — tu és a flor da minha vida!..."

Castro Alves

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