quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Borboletas no estômago


Já é tarde e já não posso mais ver proliferar-se flores do teu olhar. Já é tarde e não consigo encontrar o caminho de volta pra casa. Já é tarde e todas as expectativas foram deixadas de lado, juntas a tais lembranças que o tempo não quer apagar. Procurava teu olhar porque nele eu obtinha mel, e em meu estômago borboletas. Quão belas eram essas borboletas, que saudades elas me fazem.
Outrora achava que tu voltaria, hoje já não acho mais... Nem aquela sensação.
Em minha essência guardo sua face,e de sua face guardo minha eterna admiração

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

O lobo da Estepe

“Como não haveria de ser eu um lobo da estepe e um mísero eremita em meio a um mundo cujos objetivos não compartilho, cuja alegria não me diz respeito! Não consigo permanecer por muito tempo num teatro ou num cinema. Mal posse ler um jornal, raramente leio um livro moderno. Não sei que prazeres e alegrias levam as pessoas a trens e hotéis superlotados, aos cafés abarrotados, com sua música sufocante e vulgar, aos bares e espetáculos de variedades, às feiras mundiais, aos corsos, aos centros culturais e às grandes praças de esportes. Não entendo nem compartilho dessas alegrias, embora estejam ao meu alcance, pelas quais milhares de outros tanto anseiam. Por outro lado, o que se passa comigo nos meus raros momentos de júbilo, aquilo que para mim é felicidade e vida e êxtase e exaltação, procura-o o mundo em geral nas obras de ficção; na vida parece-lhe absurdo. E, de fato, se o mundo tem razão, se essa música dos cafés, essas diversões em massa e esses tipos americanizados que se satisfazem com tão pouco têm razão, então estou errado, estou louco. Sou, na verdade, o Lobo da Estepe, como me digo tantas vezes- aquele animal extraviado que não encontra abrigo nem ar nem alimento num mundo que lhe é estranho e incompreensível.” Hermann Hesse 

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A irrevogável justificativa para mais um caos.

E o invólucro irrevogavelmente vem envelhecendo a cada dia, as colinas com aroma de flores já estavam á envelhecer também. Tudo era utópico e tinha cheiro de chuva, as constelações pareciam estar em inefável ordem. Era tudo feito de faz de contas, e a às vezes, isso doía. O céu gritava e se agitava em alucinações e perdido,buscava ajuda ao sol,mas quase nunca o encontrava..Até as mais belas notas musicais já não eram as mesmas.Indubitavelmente eram tempos difíceis para os sonhadores,e tudo que faltará ali,multiplicava-se com afeto. A andarillha utópica só precisava de afeto. 

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Soneto 116


De almas sinceras a união sincera
Nada há que impeça: amor não é amor
Se quando encontra obstáculos se altera
Ou se vacila ao mínimo temor.
Amor é um marco eterno, dominante,
Que encara a tempestade com bravura;
É astro que norteia a vela errante
Cujo valor se ignora, lá na altura.
Amor não teme o tempo, muito embora
Seu alfanje não poupe a mocidade;
Amor não se transforma de hora em hora,
Antes se afirma, para a eternidade.
Se isto é falso, e que é falso alguém provou,
Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.
 Willian Shakespeare

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Adormecida


Uma noite, eu me lembro... Ela dormia 
Numa rede encostada molemente... 
Quase aberto o roupão... solto o cabelo 
E o pé descalço do tapete rente.
'Stava aberta a janela. Um cheiro agreste 
Exalavam as silvas da campina... 
E ao longe, num pedaço do horizonte, 
Via-se a noite plácida e divina.
De um jasmineiro os galhos encurvados, 
Indiscretos entravam pela sala, 
E de leve oscilando ao tom das auras, 
Iam na face trêmulos — beijá-la.
Era um quadro celeste!... A cada afago 
Mesmo em sonhos a moça estremecia... 
Quando ela serenava... a flor beijava-a... 
Quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia...
Dir-se-ia que naquele doce instante 
Brincavam duas cândidas crianças... 
A brisa, que agitava as folhas verdes, 
Fazia-lhe ondear as negras tranças!
E o ramo ora chegava ora afastava-se... 
Mas quando a via despeitada a meio, 
P'ra não zangá-la... sacudia alegre 
Uma chuva de pétalas no seio...
Eu, fitando esta cena, repetia 
Naquela noite lânguida e sentida: 
"Ó flor! — tu és a virgem das campinas! 
"Virgem! — tu és a flor da minha vida!..."

Castro Alves

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Epifanias

O espírito dela está perdido em seus próprios devaneios, um afeto que se prolifera a cada instante de sua existência. Um afeto indubitavelmente puro, ou talvez, com um toque de malícia. Uma límpida malicia. As rosas que eram brancas foram levemente tingidas de vermelho com o sangue dela. O sol que a guiava da escuridão, calou-se e tornou-se escuro, mal e embravecido. Calou-se por tanto tempo que agora, ela já sabia dominar a escuridão. Doce escuridão. Epifanias ainda surgem na mente dela, dilacerando todo seu ser, sendo impossível esquecer, aquele doce ser. Um oceano de lágrimas surge na face dela, tocando cada pedaçinho de resquícios dos bons momentos que ainda lhe guarda no peito. Um peito constituído agora, apenas de nostalgias... Um peito vazio de afeto, e fechado para um novo amor. 

Das tantas memórias ocultas

Tu,que és possuidor de minha alma e dono de todos meus sonhos,poderia eu, dar-lhe a carne virgem em busca de lascivo afeto e prazer.Ambos saberiam desfrutar esse prazer.O prazer do querer,do sentir,do interminável,do gosto tênue entre a inocência límpida e o pecado violento dado aos homens.Histórias belas e sujas chegariam aos meus ouvidos após o ato libidinoso,palavras intensas resultariam em choques em meu corpo,que junto ao teu,pareciam se encaixar de um modo quase que perfeito.A sedação chegaria como a primavera em nossa carne,calma,quente,coberta de flores novas,coberta de sensações inimagináveis até aquele presente momento. A eminência floresce em teus olhos que são tão frios e escuros como o crepúsculo daquela noite,um olhar tendencioso e misterioso que só as flores de Adônis era capaz de compreender.
O inverno retornaria,mas a nostalgia daquele instante duraria para sempre. Na carne,na alma,na memória e nos sonhos...sim,até nos sonhos. 

terça-feira, 30 de agosto de 2011

À Noite


A música no jardim
tinha dor inexplicável.
Um cheiro de maresia
vinha das ostras no gelo.

Ele disse: "Sou fiel!"
e tocou-me no vestido.
Tão diverso de um abraço
era o toque dessas mãos.
  

Como quem acaricia
um gato ou um passarinho,
sorria, com os olhos calmos,
sob o ouro das pestanas. 

A voz triste dos violinos
cantava, em meio à névoa:
"Dá graças a Deus que enfim
estás a sós com o amado".
Ana Akhmátova

Treze Versos


E finalmente pronunciaste a palavra

não como quem se ajoelha,

mas como quem escapa da prisão

e vê o sagrado dossel das bétulas

através do arco-íris do pranto involuntário.

E à tua volta cantou o silêncio

e um sol muito puro clareou a escuridão

e o mundo por um instante transformou-se

e estranhamente mudou o sabor do vinho.

E até eu, que fora destinada

da palavra divina a ser a assassina,

calei-me, quase com devoção,

para poder prolongar esse instante abençoado.

Ana Akhmátova

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Enigmática Nostalgia

Lento tempo que penetra em meu corpo e dilacera minha alma,que me guia até a escuridão e que cobre meus olhos da tão sublime e enigmática beleza. Terei eu o mesmo destino de Ofélia?Oh,como a loucura me consome,como a solidão me abastece e como o caos se multiplica.Percorrendo tempos imaginários,me perco em ti,nos bons momentos memoráveis que ainda me trazem um pouco de vida. O quão enigmático és teu olhar que até em sonhos tentei decifrar este enigma.O quão excitante que és tua frieza diante ao mundo,e ainda assim,um tanto dolorosa. Terei eu,tempo o bastante para abrir meus olhos e vê-lo cruzar-se ao teu outra vez? Terei tempo ao menos para...viver... outra vez?

Ausência

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.


Vinícius de Moraes

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Pálida à Luz

Pálida à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!

Era a virgem do mar, na escuma fria
Pela maré das águas embalada!
Era um anjo entre nuvens d'alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!

Era mais bela! o seio palpitando
Negros olhos as pálpebras abrindo
Formas nuas no leito resvalando

Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti - as noites eu velei chorando,
Por ti - nos sonhos morrerei sorrindo!

Álvares de Azevedo

quinta-feira, 23 de junho de 2011

-

Estranhamente vejo mudar o doce sabor da felicidade, estranhamente vejo o tempo oscilar. Torturo-me até o ultimo minuto por não alcançar das tuas tantas expectativas, e lhe proporcionar apenas dor e sofrimento. Eu olho para o passado e relembro os planos que juntas fazíamos. E os sonhos que construímos com tanto afeto e que agora são despertados pela chama da realidade. Oh,que dor possui essa presente realidade,que me consome até os últimos resquícios de fios de cabelos que ainda me restam.Torturo-me diante da cruz,apedrejando-te e apedrejando-me por pecados dos quais nem acredito. Tu vês minha dor, tu compartilhas dela e retorna ao passado para aliviar-te do fardo fatídico cotidiano. Cruelmente desconto em meu ser aquilo que eu não gostaria de ser. As marcas/feridas te ferem. E me ferem com a calmaria. Um tanto oblíqua, manipulo-te a fins de te ver rutilante outra vez. É sublime a preciosidade com que tu me tratas, é doloroso ver em tua face  lágrimas de tanto amor.Meu corpo encontrará a paz outra vez,e minha alma lhe dará sua paz também. Peço-te a ti a mais encantadora paciência, peço-te a ti que não desista ainda, peço-te a ti que multiplique esse amor e essa força,para que em algum lugar eu possa encontrá-la também. Agradeço-te por cada instante de afeto incondicional, e saibas que é totalmente recíproco. E um dia, acredito confiantemente, que sou eu quem lhe proporcionará abrigo, o mais encantador e resplandecente abrigo.Juro por ti, juro por tudo aquilo que por desolamentos do passado,deixei de crer.Ainda encontraremos um lindo jardim juntas.Sim,nós encontraremos.  






Último Brinde

Bebo ao lar em pedaços,
À minha vida feroz, 
À solidão dos abraços 
E a ti, num brinde, ergo a voz...
Ao lábio que me traiu, 
Aos mortos que nada vêem, 
Ao mundo, estúpido e vil, 
A Deus, por não salvar ninguém.


Ana Akhmátova




Ofélia,John Everett Millais

Carroça Vazia

Certa manha, meu pai, muito sábio, convidou-me a dar
um passeio no bosque e eu aceitei com prazer.
Ele se deteve numa clareira e depois de
um pequeno silencio me perguntou:
- Alem do cantar dos pássaros,
você esta ouvindo mais alguma coisa?
Apurei os ouvidos alguns segundos e respondi:
- Estou ouvindo um barulho de carroça.
- Isso mesmo, disse meu pai, e uma carroça vazia .
Perguntei ao meu pai:
- Como pode saber que a carroça esta vazia,
se ainda não a vimos?
Ora, respondeu meu pai. É muito fácil saber que uma
carroça está vazia; por causa do barulho.
Quanto mais vazia a carroça maior e o barulho que faz.
Tornei-me adulto, e ate hoje, quando vejo uma pessoa
falando demais, gritando (no sentido de intimidar),
tratando o próximo com groceria inoportuna,
prepotente, interrompendo a conversa de todo mundo e,
querendo demonstrar que é a dona da razão e da verdade
absoluta, tenho a impressão de ouvir a voz do meu pai
dizendo: "Quanto mais vazia a carroça, mais barulho ela faz..."

segunda-feira, 23 de maio de 2011

She was a phantom of delight

She was a phantom of delight
When first she gleamed upon my sight;
A lovely Apparition, sent
To be a moment's ornament;
Her eyes as stars of Twilight fair;
Like Twilight's, too, her dusky hair;
But all things else about her drawn
From May-time and the cheerful Dawn;
A dancing Shape, an Image gay,
To haunt, to startle, and way-lay.

I saw her upon a nearer view,
A Spirit, yet a Woman too!
Her household motions light and free,
And steps of virgin liberty;
A countenance in which did meet
Sweet records, promises as sweet;
A Creature not too bright or good
For human nature's daily food;
For transient sorrows, simple wiles,
Praise, blame, love, kisses, tears and smiles.

And now I see with eye serene
The very pulse of the machine;
A Being breathing thoughtful breath,
A Traveler between life and death;
The reason firm, the temperate will,
Endurance, foresight, strength, and skill;
A perfect Woman, nobly planned,
To warm, to comfort, and command;
And yet a Spirit still, and bright,
With something of angelic light. 

William Wordsworth

domingo, 22 de maio de 2011

Mais silencioso do que dormir

Mais obscuro do que a noite,
Mais intenso do que um trovão
Lágrimas e pingos de uma doce paixão.
Um olhar enigmático, um ardor lunático
A pele translúcida,de uma alma com grande ternura
Um desejo utópico,de um amor misantrópico.
Todos os pedaços,se juntaram ao acaso,
O fim chegou, e a tristeza no caixão se acabou.
Mais silencioso do que dormir,o fim não é apenas o deixar de existir
 Tão encantador como a aurora,um beijo por fim nos devora.
A maldade que no júbilo transcende,vai ao leito de um desejo inocente
O nada em fim voltou,como a dor que um dia me deixou.


quarta-feira, 4 de maio de 2011

Das tantas palavras ocultas

Todos os finais possíveis diluíram ao longo da história, o ato de ilibação se tornou tão limitado que impede o sonho a dançar com a realidade.  Um grito silencioso percorre pelas ruas em forma de chuva, percorrendo cada canto da cidade em busca de um lugar onde a melodia seja mais alta,ou pelo menos,onde haja o mínimo sequer de uma doce melodia. Lugares obscuros, uma orquestra de desastres e melancolia, talvez um tanto atraente, miscigenando sentimentos perdidos daquele subúrbio. O violino se encontrava quebrado, assim como o violinista desolado e a pobre bailarina aos pedaços. De caos em caos formou-se o júbilo físico e sonoro, onde todas as peças pareciam se encaixar, onde a poesia tornou-se rutilante (apesar de fatídica) e liberou lascivos gestos de prazer. O prazer tendencioso e o júbilo transcendente acompanharam o ritmo da escuridão e aprenderam a domá-la de tal forma que, agora, parecia clarear. E por fim, dormir eternamente.  

domingo, 1 de maio de 2011

-

''Imaginei por um momento um mundo sem Henry. E jurei que no dia que perder Henry, eu matarei minha vulnerabilidade, minha capacidade para o verdadeiro amor, meus sentimentos, com a devassidão mais frenética. Depois de Henry não quero mais amor. {…} Depois de não ver Henry por cinco dias por causa de mil obrigações, não pude suportar. Pedi a ele para se encontrar comigo durante uma hora entre dois compromissos. Conversamos por um momento, então fomos para um quarto do hotel mais próximo. Que necessidade profunda dele. Só quando estou em seus braços as coisas parecem direitas. Depois de uma hora com ele, pude continuar o meu dia, fazendo coisas que não quero fazer, vendo pessoas que não me interessam.''

Anaïs Nin

sábado, 9 de abril de 2011

A insanidade do meu jardim

O desejo incessante de não mais desejar me consome.O desejo de não errar,de não cometer falhas e atingir o inatingível me levaram à tais insanidades que agora são preciosamente controladas por sublimes poções lícitas que me garantem bem estar e sanidade mental. Sanidade mental...Como definir sanidade mental?Não sei a definição e nem tenho a  pretensão de saber. Julgaram-me insana por não acreditar naquilo que não posso ver,naquilo que não posso ouvir,e por fim,naquilo que já nem posso mais sentir.

  "Não é suficiente ver que o jardim é belo sem ter que acreditar que há fadas morando nele também?"

Juro que tentei enxergar as fadas,tentei mesmo.Só consegui ver a beleza do jardim,e como é belo esse jardim,como é ‘’livre’’ esse jardim. Tendo a ‘’liberdade’’,pude encontrar um pouco de felicidade. Tivi (e tenho) meus receios,meus medos e inseguranças,mas venho melhorando de forma inacreditável...Inacreditável até mesmo para mim. Não negarei se um dia meus olhos voltarem a ver as fadas do jardim,não negarei mesmo.Mas enquanto isso não acontece,viverei com a imagem do jardim...Apenas com a imagem da beleza do jardim.

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Vazio

I
Um labirinto conturbado, um mundo aos pedaços, um caos interminável propícios à lágrimas. Às vezes, de tantas certezas, começo a criar duvidas. O encanto acaba e a dor é inevitável, o colo daquele ‘’eterno’’ quebrou, e se fez em mil pedaços jogados ao vento. Tudo que resta são memórias, memórias de quando tudo já foi bom. Um espaço órfão a procura de afeto, de cuidado e de proteção. Um espaço machucado, mutilado e sozinho. Um espaço completamente sozinho.

II
Tempestade incessante, pingos incansáveis de angústia e desolamento. Levemente inconstante,e às vezes, num impulso, tentando sair para lugar algum. Vendo o mundo de um ângulo inexistente,imaginando coisas inimagináveis à procura de lucidez. Preza no passado,temendo o presente e ansiosa pelo futuro. Preza em mundos diferentes,oscilando entre a inocência e o pecado. Um pecado que em dias tempestuosos,proporciona um certo refúgio. Oscilando entre o tudo e o nada,e o ‘’nada’’,se encontra reconfortante.

Notas Do Subsolo

"Tenho, por exemplo, um terrível amor-próprio. Sou desconfiado e me ofendo com facilidade, como um corcunda ou um anão, mas,realmente, tive momentos tais que, se me acontecesse receber um bofetão, talvez até me alegrasse com o fato. Falo sério: com certeza, eu saberia encontrar também nisso uma espécie de prazer - naturalmente o prazer do desespero, mas é justamente no desespero que ocorrem os prazeres mais ardentes, sobretudo quando já se tem uma consciência muito forte do inevitável da própria condição.

E, no caso do bofetão... sim, fica-se comprimido pela consciência do mingau a que nos reduziram. E o principal, por mais que se rumine o caso, está em que eu sou o primeiro culpado de tudo e, o que é mais
ofensivo, culpado sem culpa e, por assim dizer, segundo as leis da  natureza. Pois, em primeiro lugar, tenho culpa de ser mais inteligente  que todos à minha volta. (Considerei-me, continuamente, mais inteligente
que todos à minha volta, e às vezes - acreditam? - tinha até vergonha disso. Pelo menos, a vida toda olhei de certo modo para o lado e nunca pude fitar as pessoas nos olhos.)

Finalmente, sou culpado porque, mesmo que houvesse em mim generosidade, eu teria com isso apenas mais sofrimento devido à consciência de toda a sua inutilidade. Certamente eu não saberia fazer nada com a minha generosidade: nem perdoar, pois o ofensor talvez me tivesse batido segundo as leis da natureza, e não se pode perdoar as leis da natureza nem esquecer, pois, ainda que se trate de leis da natureza, sempre é ofensivo.

Finalmente,mesmo que eu renunciasse a ser generoso e,ao contrário,quisesse vingar-me do ofensor,de nada poderia vingar-me de ninguém,pois,certamente,não ousaria a fazer algo,mesmo  que pudesse''.

Dostoiévski

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Passeios ao Vento


Há dias em que o caos ensandecido toma conta do meu ser, fazendo-me lembrar coisas das quais seriam melhor esquecer. Aquelas pinturas, melodias e todas as memórias nostálgicas me tomam como o vento, me faz percorrer lugares inimagináveis em busca de qualquer coisa que seja melhor do que aquela que eu já vi. Aquelas crenças foram quebradas e levadas ao vento como tantas outras peças de mim mesma que joguei pela janela diante daquela ventania que eu via lá fora. Só nós podíamos interpretar com nitidez o que a pintura mostrava, só nós éramos capazes de ouvir o que a melodia nos contava. Tapei os olhos para a pintura e os ouvidos para melodia,por um momento acabou-se meus sentidos,e deixei o vento me guiar.